sexta-feira, 11 de abril de 2014

Ainda temos muito tempo...



            Ouvi dizer que o mundo acabará em breve. Então eu não poderei mais acordar numa manhã de domingo, olhar pro teto ainda com a vista turva de sono e sorrir ao me lembrar que no último sábado estive com você. Então eu não poderei saber que aquele nosso encontro no fim da tarde estará confirmado pra mesma hora e no mesmo lugar.
            Ouvi dizer que o mundo acabará em breve. Então eu não poderei mais olhar você enquanto dirige seu velho carro preto por aquela rua em que ouvi aquelas primeiras promessas de que seríamos sempre o caminho um do outro. Então eu não poderei voltar pra casa e esperar a hora em que você chegará e que nós abriremos seu vinho preferido que me deixa tonta muito rápido e com uma terrível dor de cabeça no dia seguinte.
            Mas se o mundo por acaso não acabar, ainda teremos muito tempo pra corrigir as velhas manias que provocam as mesmas velhas brigas. Teremos tempo de olhar pela janela quando for madrugada e quase toda a cidade estiver entregue ao sono dos justos. Teremos tempo de ver nossos filhos crescerem e nos darem netos e ver nossos netos crescerem e nos darem bisnetos.

            Se o mundo por acaso não acabar, ainda teremos tempo pra fazer aquela viagem que talvez será pro Rio de Janeiro, talvez pra São Paulo, talvez pra Paris ou pra qualquer um dos lugares em que sonhamos conhecer. Ainda teremos tempo de comprar aquela casa com um lago no quintal e um carvalho alto e velho na entrada da varanda pra montarmos um balanço e aproveitarmos os dias curtos da primavera. Ainda teremos tempo pra esquecer que as pessoas estão olhando enquanto você me beija no meio da rua. Porque ainda nos amaremos mesmo quando o tempo ameaçar findar nossos dias, mesmo quando parecer que não há tempo pra aproveitar, nos amaremos quando tudo for incerto e não houver lugar seguro, nos amaremos quando tudo for guerra e quando parecer que nem o amor existe mais. Apesar de tudo, ainda nos amaremos. 

Se chover hoje à noite...


                   

            Se chover hoje à noite, vá até o armário, pegue o cobertor que você mais gosta, o que tem seu cheiro com mais intensidade, depois coloque várias almofadas naquele sofá-cama velho e acabado. Ligue a tv, escolha qualquer filme, qualquer um mesmo, congele-o logo no início, desça os degraus de sua varanda, leve consigo um daqueles guarda-chuva gigantes, dobre a esquina e siga por aquela rua de todos os dias. Pare no meu portão, ligue no meu celular e diga que está me esperando. Se eu duvidar, ameace gritar até acordar os vizinhos. Me diga pra vestir aquela blusa preta de que você tanto gosta, uma calça jeans qualquer e aquele par de tênis velhos, depois me diga pra sair depressa e me receba com um beijo até que seu nariz gelado me faça cócegas, passe o braço em torno dos meus ombros e nos guie de volta à sua casa. No caminho, ria alto, cite aquelas frases loucas que você sempre cria durante a madrugada, nos leve de propósito em direção às poças d’água até que nossos sapatos e a barra de nossas calças fiquem completamente molhados. Abra o seu portão, feche o guarda-chuva e finja uma zanga ofendida quando eu te roubar um beijo. Vamos direto pro sofá, dê play no filme e deixe o volume baixo. Eu sei que logo você vai achar algo tolo no filme e eu vou achar ótimo ver seu cenho se franzir com indignação. Deite a cabeça no meu colo e me deixe bagunçar seu cabelo meio molhado pelos pingos da chuva. Se chover hoje à noite, me permita adormecer sentindo sua respiração próxima ao meu rosto, me castigue por todos os beijos que eu te roubar, fique me olhando daquele jeito que sempre me deixa tímida e no frio da noite, me deixe esquecer das horas e apenas te amar.